quinta-feira, 30 de junho de 2011

Paixão que não enferruja.

“Aqui, pelo menos, as ferrovias não morrem tão cedo”.  
Por: O vigilante Vladimir Cavalcante Sibilio 



O senhor de cabelos brancos adentra a sala com a fotografia de um trem estampada na camisa. Em seguida, um homem de meia-idade chega com uma pilha de fotos de locomotivas debaixo do braço. Um terceiro carrega com cuidado sua estrada de ferro feita artesanalmente. É sábado, e o sol está a pino. Cerca de 30 pessoas se reúnem na desativada Estação Barão de Mauá (a popular Leopoldina), no Rio de Janeiro, para, entre um cafezinho e outro, reviver os tempos em que os trens cruzavam o Brasil.

Plantados em frente a uma maquete que beira os cinco metros de comprimento, cada membro da Associação de Ferreomodelismo da cidade bota seu trenzinho elétrico para rodar. Enquanto os vagões em miniatura percorrem o trajeto, seus donos conversam de tudo um pouco. E, invariavelmente, o papo volta para o assunto preferido deles: ferrovias.

Nascido em Madureira, Zona Norte do Rio, Fernando Navarro Guater, de 60 anos, cresceu com a maria-fumaça na cabeça. O trem, que passava nos fundos de sua casa, apitava avisando a hora de sua mamadeira. Fernando nunca trabalhou em ferrovias. Mas é uma enciclopédia viva sobre o assunto. Presidente da associação, foi ele quem construiu a enorme maquete que semanalmente faz a alegria de jovens, adultos e idosos. “Desde pequeno era apaixonado por trens. Aos 14 anos, eu já fazia coleção”, conta.

Filho de jornaleiro, ele assumiu a banca do pai em 1984, quando começou a praticar o ferreomodelismo. Em meio aos jornais e revistas que vendia em frente à Central do Brasil, Fernando passou a confeccionar pequenas estradas de ferro, enquanto devorava as publicações sobre o tema. Aquilo foi chamando a atenção dos clientes, e quando se deu conta, um grupo de aficionados já se reunia toda sexta-feira para “brincar” em suas maquetes. Criou a associação em 1996, mas somente com a virada do século, quando se aposentou, levou toda aquela produção para a Barão de Mauá. Todo mundo foi atrás.

“Temos quase 100 sócios, e todo sábado vem uma média de 60 pessoas praticar o ferreomodelismo”, afirma. São médicos, militares, engenheiros, empresários. Gente como o comerciante Antônio dos Anjos Barbosa, de 65 anos. Sua única relação com os trilhos é como passageiro. Ele passou 30 anos pegando a composição em Bento Ribeiro, bairro da Zona Norte do Rio, e seguindo até o Centro, onde trabalhava.

“Sou o sócio número oito”, avisa, orgulhoso. “Isso aqui é um hobby. A gente conversa muito, fica mais ligado no que está acontecendo com as ferrovias”, explica, desatando a falar sobre a malha ferroviária brasileira: “Tenho todos os livros sobre isso”.

Mas o ferreomodelismo não é um hobby restrito a poucos. Espalhadas pelo Brasil, as associações estão nos mais remotos municípios e abrangem as mais variadas idades. Com 38 anos, o vigilante Vladimir Cavalcante Sibilio também não perde um sábado na Barão de Mauá. Usuário dos trens metropolitanos, volta e meia ele deixa as miniaturas de lado para embarcar com a turma nas rotas turísticas que restaram pelo Brasil. “Nunca andei tanto de trem”, diz com um sorriso largo e uma certeza que é comum a todos os ferreomodelistas: “Aqui, pelo menos, as ferrovias não morrem tão cedo”. 

 

A malha ferroviária brasileira não é mais a mesma. Mas para os praticantes do ferreomodelismo, o tempo da maria-fumaça continua vivo.

Por: Bernardo Camara






3 comentários:

  1. Prezado Clodoaldo;
    é vc que deu uma entrevista na CBN? Neste sábado?

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  2. Jair sim fui eu o entrevistado da Cbn.
    Obrigado pela visita!

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  3. Imagem do artigo: Locomotiva Sharp & Stewart n.15 e Carro Imperial / D. Pedro II - Ferrovia São Paulo Railway - Modelo e maquete construidos por Renato Gigliotti/Santo André-SP ( MPh )

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