terça-feira, 20 de setembro de 2011

Quando o futebol andava de trem!


Eduardo Cunha Hernandes/FotoRepórter/AE

Times de futebol se formaram a partir da construção de ferrovias no Brasil e muitos permanecem até hoje.
O futebol nasce nos lugares menos esperados. Um grupo de meninos, numa rua de um bairro qualquer, transforma qualquer objeto em bola e instintivamente sabe como se posicionar e o que fazer. Em um País de dimensões continentais como o Brasil, pessoas de cada um dos quatro cantos conhecem a arte da bola no pé.
E como será que o futebol ganhou todo o País? Acredite ou não, uma das formas foi a construção das ferrovias nacionais. Isso mesmo, um dia o futebol andou de trem. Há quem diga que até hoje essa cultura permanece viva, na memória de times lendários, como o Ferroviário Atlético Clube, nascido em Fortaleza, Ceará.
O clube surgiu quando os funcionários da antiga Rede de Viação Cearense (RVC), atual Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN), organizaram uma pelada como forma de trégua para as longas jornadas de trabalho. Com o sucesso das peladas, veio a feliz ideia de organizar algo maior. A união dos primeiros times que haviam se formado, Matapastos e Jurubeba, deu vida ao Ferroviário, em 1933, pelas mãos de Valdemar Cabral Caracas, um dos chefes da antiga RVC, hoje com 103 anos de idade.
Para o torcedor apaixonado, Ítalo Rufino, 22, a devoção pelo time começou, praticamente, desde o dia em que ele nasceu. “Nasci em 1988, por coincidência ou não, ano em que o Ferroviário foi campeão cearense pela sétima vez. Digo que sou Ferroviário desde que nasci, coisa de torcedor, mas na prática foi quando meu pai começou a me levar aos jogos, em 1994. Digamos que ele me apresentou àquela que é hoje uma das maiores paixões da minha vida, mas quando estou de férias em Fortaleza, eu é quem tenho o trabalho de levar meu pai aos jogos”, risos.
O Ferrão, como também é conhecido, já faz parte da cultura local e sua relação com a comunidade vai muito além de uma mera prática de esportes, como explica o Gerente de Projetos da Associação dos Amigos do Ferroviário Atlético Clube (AAFAC), Moisés Junior, 26. “Focamos em ajudar comunidades carentes por meio de ações sociais e projetos beneficentes. Podemos destacar nosso último projeto, o “Natal Solidário Coral”, onde compramos presentes para todas as crianças do hospital infantil da cidade. Nosso mascote, o Tutuba, caracterizou-se especialmente de “Tutuba Noel” para fazer a distribuição desses presentes, trazendo alegria para todos”, conta.
A história de trilhos e futebol no Brasil pode parecer recente, mas data de um tempo bem distante. O fato é que essa relação se deu há muitos anos, com o início da construção das primeiras ferrovias, quando as comunidades se formavam nos arredores dessas grandes obras. Como já era esperado, as atividades desenvolvidas por esses grupos ganharam força e ultrapassaram os limites das relações de trabalho.
Mais precisamente no ano de 1884, o paulistano nascido no bairro do Brás, Charles Miller, trouxe a primeira bola de futebol de uma viagem à Inglaterra e logo ensinou aos companheiros brasileiros como o esporte funcionava. O futebol tomou fama e o primeiro jogo realizado no País, que se tem notícia, aconteceu em 15 de abril de 1895, entre funcionários Companhia de Gás de São Paulo e a Companhia Ferroviária de São Paulo Railway.
A partir de então, muitos clubes e cidades se desenvolveram após as construções das linhas ferroviárias, como é o caso dos times da região noroeste do Estado de São Paulo, como o América de São José do Rio Preto, Marília, Noroeste de Bauru e, claro, da Ferroviária de Araraquara.
No Sul do País, o Paraná Clube se destaca. O tricolor paranaense é resultado da junção entre os clubes Pinheiros e Colorado, este, que já era o resultado da fusão entre Ferroviário, Britânia e Palestra. O Ferroviário foi um grande time no início do século. Seu estádio, a Vila Capanema, recebeu jogos da Copa do Mundo de 1950 e até a década de 70 era conhecido como o mais moderno do Estado.
Oito vezes campeão estadual, foi o primeiro representante paranaense em um torneio nacional, quando em 1967 disputou o Torneio Roberto Gomes Pedrosa, embrião do atual campeonato brasileiro. De um simples time de funcionários da Rede Ferroviária de Curitiba, o time decolou e se colocou entre as principais forças do Paraná.
Ainda no Sul do Brasil, há histórias como a do Operário Ferroviário Esporte Clube, fundado em 1912, na cidade de Ponta Grossa, também no Paraná. O que mais chama a atenção do torcedor Henrique Schoemberger, 23, é, justamente, a forma como o time surgiu. “Acredito que o fato de ser fundado pelos trabalhadores ferroviários e a tradição de ser o segundo time mais antigo do Paraná, é algo muito marcante. Uma memória que passa de geração para geração. Eu, por exemplo, tenho fotos que eram dos meus bisavós e avós, dos times dos anos 20 e 30 e, da mesma forma, quero continuar com essa tradição em minha futura família.”
O estádio Germano Krüger é a casa do Operário e de toda a sua torcida “fantasma”, apelido que o time carrega desde os anos 50. O local possui valor imensurável para toda a região por ter sido palco da primeira partida de futebol do Paraná, em 1910, entre uma agremiação dos trabalhadores da Rede Ferroviária e o time do Coritiba Foot Ball Club.
Felippe Krüger, 23, tem uma ligação muito forte e compreensível com o time, que foi herdada, literalmente, por laços de sangue. “Comecei a torcer pelo Fantasma desde bem pequeno, por influência de meu avô. Sem dúvida o momento mais marcante da história do time foi a volta do Fantasma à elite do futebol paranaense, depois de 15 anos fora, fato ocorrido em 2009.”
Times como o Paraná Clube, o Operário Ferroviário Esporte Clube e o Ferroviário Atlético Clube são alguns dos exemplos de equipes que nasceram desse movimento histórico e muito importante para o futebol brasileiro. Ainda hoje a história permanece viva e incorporada nas vidas dos que passaram a torcer pelos times quase que por uma tradição familiar.
“Existem os craques que ouvi falar pelo meu pai, pelos amigos da imprensa esportiva e pelos torcedores mais antigos, como Hélio Silvestre, Ribamar, Silvio Cosmoski, Leocádio e Otavinho, que eram do esquadrão de 61; Padreco e Sabino, do timão de 69; e João Marcos, Joceli, Celso Reis, Dico e Niquinha, que foram craques dos anos 90.” Thiago Moro, 30, coordenador do site não-oficial OPERARIO.com “A Torcida do Fantasma na Net”, lembra de maneira saudosa dos fatos citados por Moro, alguns ele sequer presenciou, mas relata cada cena como se tivesse participado de todas as partidas de seu time do coração.

Por: Thiago Moro
Fonte: Ministério do Turismo

Um comentário:

  1. Até isso a privatização nos tirou.Como era bom assistir o Boca Negra jogar.Glauio Elias

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